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Livro de Ezequiel
Livro de Ezequiel

 

Entendendo o Livro do Profeta Ezequiel

Mês da Biblia 2024

 

01. Neste ano, a Comissão de Animação Bíblico-Catequética da CNBB e as instituições bíblicas, escolheram como tema para o mês da Bíblia 2024 o Livro de Ezequiel à luz do lema "Porei em vós meu espírito e vivereis" (Ez 37,14). Esse livro foi escolhido tendo em vista a preparação para o Ano Santo em 2025, que terá como tema a "esperança", dado que a principal finalidade da profecia de Ezequiel é despertar a esperança na comunidade judaica, durante o Exílio Babilônico. Assim como Ezequiel foi um defensor da esperança em meio às adversidades, somos chamados a seguir seu exemplo, espalhando a esperança de Deus em um mundo que muitas vezes parece desesperançado. Em 2025 estudaremos a Carta aos Romanos, em 2026 o Livro de Daniel e em 2027 será a vez da Segunda Carta aos Coríntios.

 

02. O livro de Ezequiel coloca-nos diante de uma das etapas mais atribuladas e trágicas da história do Povo de Deus. O reino de Judá, no Sul de Israel, fraco e indefeso diante dos grandes impérios da época, vê-se mergulhado em uma disputa de ordem internacional, sem ter condição alguma de interferir em seu próprio destino. De um lado, o império Assirio, Babilônico e da Persa; do outro, o reino do Egito. No meio, tentando equilibrar-se entre esses poderosos impérios, está Judá com seus sucessivos reis, com desastrosas tentativas de alianças politicas mal feitas, misturadas aos interesses pessoais de poder e ambição. Apesar do alerta e do conselho dos profetas, como Isaias, Jeremias e Sofonias, eles continuavam praticando a exploração e a violência contra o povo. O resultado foi o exílio para a Babilônia em três deportações (597, 587, 582) e a destruição do país e da capital Jerusalém. 

 

03. A Bíblia menciona vários exílios, sendo o mais conhecido o Babilônico, que ocorreu por volta do século VI a.C. Nesse período, Nabucodonosor, rei da Babilônia, lançou uma grande ofensiva militar na região visando controlar rotas comerciais estratégicas e expandir as fronteiras de seu império até o Egito. Em 597 a.C., chegou em Jerusalém, o rei Joaquim, o décimo nono rei de Judá, fez um acordo com o rei da Babilônia. Ele se entregaria sem oferecer resistência, garantindo que a cidade permanecesse intacta e funcionando plenamente. Nabucodonosor, aceitou o acordo, prendeu Joaquim, juntamente com a rainha-mãe, a nobreza, os anciãos, escribas, juízes, militares, sacerdotes, comerciantes e fazendeiros, e os deportou para a Babilônia. Entre os deportados estava um jovens candidato ao sacerdócio chamado Ezequiel, cujo nome em hebraico significa ‘que Deus torne forte’. No lugar de Joaquim, Nabucodonosor colocou Matanias, também conhecido como Sedecias (2 Rs 24,8-17).

 

04. Quando os deportados chegaram na Babilônia nem quiseram desarumar as malas. Pensaram que Javé iria libertá-los dentro de pouco tempo. Depois de tantas besteiras e crimes cometidos, ainda tinham a coragem de fazer cobranças ao Senhor. Jeremias mandou-lhes uma carta dura dizendo para que fizessem do exilio um tempo de conversão (Jr 29,3-10).

 

05. Babilônia, na época, era a maior cidade do mundo ocidental, com cerca de 1 milhão de habitantes e construções magníficas que transmitia poder. Os deportados se sentiam como tirados do interior de uma cidadezinha de Minas e levados para Nova York, causando-lhe um grande choque. Diante da força cultural presente em Babilônia, Ezequiel participou de um esforço monumental para manter a identidade do seu povo em um ambiente completamente adverso. Manter a sua cultura, a fé, a religião sem se deixar envolver pela religião imperial e pelas benesses oferecidas pelo império. Ezequiel, junto com outros, foi o porta-voz de um intenso trabalho muito intenso de uma comunidade mergulhada em uma grande cidade. A 1ª coisa que ele precisou preservar foi a língua hebraica, já que a língua falada na Babilônia era o aramaico. A 2ª coisa foi preservar a memória produzindo livros. A 3ª, foi criar celebrações alternativas onde se podia falar e ler o livro na língua nativa. 4º manter os vinculos familiares, não se deixar desagregar como familia (surgimento das listas geneaçogicas) e 5º, não perder nunca a esperança de voltar. Aqui esta a grande contribuição de Ezequiel para resistir ao império. Não se deixar dominar, se ababer, e se envolver pelas benezes da Bbilonia.

 

06. Como sacerdote, Ezequiel era formado na escola teológica da monarquia davídica, influenciada pelo movimento deuteronomista que teve seu início na época do rei Ezequias, mas foi consolidado no reinado do rei Josias (2Rs 22-3-10; 2Rs 23,1-27), com o objetivo principal de centralizar o culto no templo de Jerusalém em nome de Javé, Deus oficil de Judá. Esse movimento defendia a ideia de que Javé era o único Deus poderoso e glorioso presente unicamente no templo de Jerusalém, sua morada (Dt 13; Is 2,6-22) e escolheu Israel como seu povo eleito e fez com ele uma aliança (Ez 9,3; Dt 6,4 e 7,6). Essa aliança era entendida como um compromisso recíproco de retribuição, se o povo observar as leis de Javé, receberá proteção e bênçãos: ganhar a terra, fecundidade, segurança e bem-estar, mas se pecar, se desobedecer, a maldição abaterá o povo com a evasão e a destruição de Jerusalém (Dt 28,1s).

 

07. Esse movimento condenava todo tipo de idolatria e injustiça praticadas pelos governantes e apela para a fidelidade absoluta a Javé o Deus unico e oficial de Jerusalém. Os outros deuses deverriam ser condenados (Ez 6,1-10; Dt 13,2-19) e o culto só se poderá ser feito a Javé oficial no templo de Jerusalém. O Senhor Deus Javé se compromete com a dinastia davídica Davi (Ez 34,23-24; Is 11,1-9) e seus herdeiros reinarão em Israel para sempre (1Rs 11,35). O rei, sendo da dinastia de Davi, deve governar o povo com o direito e a justiça, promovendo a paz sobretudo para os pobres e sofredores (Ez 22,6-7; Dt 24,14-22). Por conta de tudo isso, Ezequiel não conseguia acreditar que Jerusalém pudesse passar pela mesma situação que Samaria, a capital do Reino do Norte, enfrentou em 722 a.C., quando foi atacada pela Assíria. Para ele, a cidade santa de Jerusalém, o Templo, e a monarquia eram instituições fortes e indestrutíveis que ofereciam segurança por serem símbolos da aliança com Javé.

 

08. Para alcançar esses objetivos, Josias e seus escribas revisaram, ampliaram e reeditaram o núcleo do Deuteronômio (Dt 12-26) que veio do Norte após a queda da Samaria, e o transformaram em Dt 4,44-28,68, chamando-o de o Livro da Aliança (2Rs 23,2). E a pedido de Josias, os escribas também organizaram a redação principal da história de Israel, que se encontra nos livro do Deuteronômio, Josué; Juízes; 1 e 2 Samuel e 1 e 2Reis. Assim, podemos afirmar que a teologia davídica e o movimento deuteronomista moldaram as mensagens de Ezequiel na Babilônia e guiaram o estabelecimento da teocracia em Jerusalém após o exílio. No livro de Ezequiel essas ideias transparecem ao trazer uma linguagem ligada ao culto, a preocupação com o puro e impuro, a crítica à idolatria e a restauração que se dará a partir do Templo e a redistribuição da terra (40-48).

 

09. Após cinco anos em terra estrangeira, Ezequiel foi chamado a ser profeta e sentinela da casa de Israel (3,16-27; 33,1-9) ou seja, alertar os deportados a não se esquecerem de suas origens. Ele foi chamado de filho do homem (93 x), e a sua missão foi a de conscientizar os exilados a respeito da situação de Jerusalém no reinado de Sedecias e ajudá-los a entender o porquê do exílio. Em êxtase (1-3) é levado a Jerusalém. No Templo, ele vê como o povo eleito afastou-se de Deus e da Aliança e vê cultos a deuses pagãos (ídolos), na Casa do Senhor. Javé é o Deus que o tirou da escravidão do Egito e lhe fez um povo livre, com uma Lei e uma Terra. A fé no Deus de Israel mantém esse povo no caminho da fraternidade, da justiça, da liberdade. Essa é a aliança. Os deuses dos pagãos são recursos culturais de manutenção do poder dos grandes sobre os pequenos, da exploração, da desigualdade, da violência, da injustiça. A idolatria é um sinal de traição e abandono da Aliança com Javé. A injustiça e a violência passaram dos limites. Javé anuncia uma punição. Jerusalém será destruída e ele abandonará o Templo que também será destruído. A mensagem do profeta Ezequiel não é a destruição, mas ajudar o povo a entender que a destruição é consequência das escolhas erradas feitas pelos governantes, afastando a população de Javé e do seu projeto. A casa dele, tornou-se ponto de encontro, local onde os deportados iam constantemente para meditar, estudar a Palavra de Deus e receber notícias que chegavam de Jerusalém, visto que em muitas partes do livro, o profeta dá a entender que ele sabia o que ocorria em Jerusalém (8,1; 14,1; 20,1s; Jr 29; 51, 59-63). Esses encontros provavelmente foram precursores das sinagogas que surgiram naquela época.

 

10. Enquanto isso, em Judá, o rei Sedecias, governava o país com violência e opressão. Apesar de haver muita instabilidade em seu governo, durante dez anos, manteve fidelidade ao rei da Babilônia, pagando pontualmente os tributos devidos. No entanto, instigado pelos profetas da corte, como Hananias (Jr 28), um falso profeta, que só dizia o que os governantes mandava dizer e não o que deveria ser dito e também instigado pelos reis vizinhos que incentivavam aliança com o Egito e estimulavam uma rebelião contra a Babilônia (Jr 28,1-17), Sedecias foi levado por sua ambição de poder e riqueza a se rebelar. Naquele momento era um suicídio rebelezar-se. Seria o fim de tudo. E quem acabaria sofrendo mais, como sempre, seríam os mais pobres. Jeremias, afirmava que se submeter ao império babilônico era o mais correto e o único meio de sobreviver (Jr 38,17). Segundo ele, a rebelião só provocaria mais violência, represálias e uma consequente invasão babilônica. Ezequiel compartilhava do mesmo pensamento e também criticava a política militarista e expansionista do rei Sedecias (Ez 34,1-16); aliança com o Egito que incluía a adoção de divindades egípcias (Ez 29), levaria à destruição total da cidade de Jerusalém.

 

11. Para Ezequiel alianças para acumular poder e riqueza traziam injustiças, crimes e idolatria, por isso ele diz que Javé abandona o Templo de Jerusalém e se exila na Babilônia entre os exilados do grupo do Rei Joaquim (Ez 10,1-11,25). Ezequiel condena a política de rebelião contra a Babilônia implementada por Sedecias, pois isso poderia desencadear punições para os exilados e também acabaria causando a destruição de Jerusalém e do Templo com uma nova invasão da "grande águia" (17, 1-21). Qualquer tentativa de insurgir-se contra a Babilônia colocaria em risco a vida dos deportados e causaria uma destruição ainda maior de Jerusalém, a cidade santa de Deus.

 

12 - Nessa alegoria percebemos que a grande águia é Nabucodonosor, rei da Babilônia; o cedro é a casa real de Davi (família/dinastia); o ramo (renovo) retirado do topo do cedro é o rei Joaquin. A terra do comércio é Babilônia. O germe (semente) é Sedecias. A outra águia é Faraó, rei do Egito. Esta parábola informa a rebelião de Sedecias contra o rei da Babilônia e suas consequências.

 

13. Os deportados, por sua vez, estavam certos de que os babilônios seriam derrotados em um eventual ataque de repressália a Sedecias. No entanto, Ezequiel via as coisas com mais realismo e convidava-os a não terem ilusões: as manobras políticas, militaristas e expansionistas de Sedecias não significariam liberdade, mas, pelo contrário, conduziriam a uma nova deportação e à destruição total de Jerusalém. A rebelião contra a Babilônia poderia contrariar punições para os judeus exilados e acabaria causando a destruição de Jerusalém e do Templo (17,1-21). E foi isso que aconteceu.

 

14. Após dois anos de cerco, em 587 a.C., o rei da Babilônia retornou a Judá, e desta vez para valer. Derubaram os muros de proteção da cidade, Jerusalém com seu Templo, foi devastada, incendiada e o “resto” da população pobre que ficou após a primeira invasão, foi deportada (2Rs 25,1-21). Não restou pedra sobre pedra. Rios de sangue correram pelas ruas da cidade. Foram cenas terriveis de dor, morte, fome e abandono. As imagens descritas no Livro das Lamentações ilustram muito bem essa terrível experiência (Lm 2,1-13). Essa trágica sequência de eventos marcou o fim do reino de Judá e um golpe profundo na identidade religiosa e cultural do povo judeu.

 

15. Tudo aquilo que havia sido um sinal visível da presença de Javé e que lhes davam segurança, foi destruído: a Cidade Santa, a morada de Javé para sempre (Sl 132, 13-14), foi arruinada (Lm 1,6; 2,1-10); o Culto, instituído como sinal perpétuo de Javé, foi interrompido (Lm 2,6-7); o Rei da linhagem de Davi, designado por Javé para manter uma lâmpada acesa em Jerusalém (1Rs 11,36), não existia mais; a Terra, um dom de Deus para sempre, caiu nas mãos do inimigo (Dt 1,34; Jr 39,10; 52,16); os Sacerdotes foram massacrados (Jr 52,24-27) ou levados para o exílio (Sl 79,1-3; Lm 4,16), o Templo, destinado a ser para sempre a casa de Javé, foi incendiado (1Rs 9,3). A partir de então, o reino de Judá foi transformado em uma província do Império Babilônico e a dinastia de Davi chegou ao fim (2Cr 36,14-20).

 

16. Nabucodonosor, rei da Babilônia, colocou à frente do governo de Judá, um nobre judeu chamado Godolias. As áreas de terra que ficaram desocupadas foram entregues, não só, aos agricultores pobres (2Rs 25,12; Jr 52,16), mas também aos povos vizinhos. Os remanescentes sentiram-se privilegiados por receberem terras para continuar suas atividades, em comparação com os que foram exilados, pois acreditavam que eles tinham recebido punição de Javé por explorarem a população (Lm 2,1-10; 4,1-11, 5,1-16 e Ez 11,15).

 

17. Parecia que a paz ia predominar, mas, em 582 a.C., nobres judeus refugiados em cidades vizinhas e que escaparam das duas deportações (Jr 40, 11; 43,5) voltaram para Judá procurando restaurar a antiga monarquia davídica: mataram Godolias e promoveram nova revolta contra a Babilônia. O povo que permaneceu fiel a Godolias, o governador, fugiu para o Egito. Com eles foi o profeta Jeremias (Jr 43,6). O exército da Babilônia, voltou, sufocou a revolta e os enviou cativos para a Babilônia (Jr 52,30). Muitos sonhos, esperanças e projetos construídos ao longo de gerações foram desfeitos, tanto para quem foi para o desterro quanto para quem ficou em Judá. Foi a terceira e definitiva deportação.

 

18. Diante de toda desolação, sendo descritos como “ossos secos” (37,1-14) os exilados estavam à beira de perder sua identidade e razão de viver (37,11; 20,32; 33,10). Entre eles não havia vida alguma. Era um silêncio devastador. O profeta contempla esse cenário desolador. No entanto, esses ossos estavam em um vale. Os vales são lugares de potencial. É nos vales que os ventos sopram, trazem vida. Nesse contexto, o profeta anuncia a conversão e a restauração do povo pelo Espírito (vento) de Deus. O Espírito transforma inicialmente os ossos secos em cadáveres, e depois esses cadáveres em seres vivos que marcham como “um exército imenso”. É a ação efetiva de Javé que cria vida, forma consciência e organiza a ação comunitária. A visão dos “ossos cobertos de Espírito” em Ez 37,1-14 visa despertar esperança nos deportados tanto do passado quanto do presente.

 

19. Diante dessa realidade, no fundo do poço, o povo se questionavam sobre suas vidas no exílio e ansiavam pelo retorno para casa. Alguns se perguntavam: Por que estamos aqui? Quem é o culpado por tanta desgraça que caiu sobre nós? Ainda há esperança? Será que Javé nos castigou e nos abandonou? Será que ainda nos ama? Nessa grande crise, surge a tentação de culpar Javé e os antepassados pelo exílio (Ex 20,5). Ezequiel, o sacerdote-profeta, apontou o caminho para a saída da crise, insistindo na presença de Javé que acompanha o seu povo. Ele ergueu sua voz de esperança, assegurando-lhes que Javé não havia esquecido a promessa feita. Essa promessa, registrada em 2 Samuel 7, revela que, embora Davi não construísse o templo, Javé estabeleceria uma casa duradoura para a sua descendência. Embora a dinastia de Davi (o “ramo mais elevado” do “cedro” em Ez l 17, 3-4) tenha sido arrancada, Javé não abandonou seu povo. Ele prometeu plantar um “novo ramo” na montanha de Israel, fazendo-o frutificar e tornando-o uma árvore robusta e de grande porte (Ez 17, 22-23). Isso significa que Ele restaurará a dinastia davídica em Jerusalém, assegurando ao seu povo um futuro pleno de vida, felicidade e paz sem fim. Ezequiel compartilhou essa mensagem de esperança, lembrando-os da fidelidade divina e da promessa de restauração. Ele também denunciou cinco categorias de influentes na sociedade que haviam corrompido Jerusalém: os governantes, os sacerdotes, os oficiais, os profetas e os fazendeiros (Ez 22, 17-31).

 

20. Essas pessoas, movidas pela cobiça, ganância, poder e busca por riquezas, estabeleceram alianças com o Egito e outras nações vizinhas (Ez 16, 23-29). Adotaram práticas religiosas e costumes desses povos, incluindo idolatria, abominações e prostituição. Como resultado, a injustiça, opressão e violência contra os pobres e necessitados proliferaram (Ez 7, 23 e 22, 1-16). Ezequiel apontou esse comportamento como o grande mal que levaria à autodestruição da nação, conhecido como o “dia de Javé” (Ez 16, 43). Assim, ele criticou severamente os governantes e anunciou que o “dia de Javé” se manifestaria na devastadora invasão do exército babilônico (Ez 22,13-16). Além dos governantes, outro grupo severamente criticado por Ezequiel são os profetas. Eles mascaravam tudo isso com visões falsas e adivinhações, dizendo “assim diz o Senhor Javé” quando Javé não havia falado nada. Eles usavam sua função para lançar mensagens inventadas a serviço dos interesses dos governantes injustos, e não para o bem-estar do povo (Ez 13, 1-6).

 

21. No entanto, Javé ofereceu esperança: Ele perdoara o pecado de Jerusalém e estabelecera uma nova aliança com Israel, desde que o povo demonstrasse um ‘coração íntegro e um novo espírito’ ( Ez 11,19-21,18,31, 36,26-27 e 37,3-14). Os exilados foram instruídos a permanecer ‘puros’ na terra estrangeira, observando práticas como a circuncisão, o sábado (Ez 20,18-20, 32,19-21, 36,16-25 e 37,23). Além disso, cada indivíduo seria julgado e condenado por Deus de acordo com seus pecados (incluindo a não observância da lei da pureza (Ez 14,12-23 e 18,1-32).

 

22. Além do grupo liderado por Ezequiel, havia na Babilônia outro grupo levado na segunda deportação em 597 a.C. Essas pessoas enfrentaram uma opressão ainda mais severa e não tiveram a mesma sorte dos primeiros deportados. A Babilônia não demonstrou compaixão e impôs um fardo pesado sobre eles (Is 47,6b), obrigando-os a trabalhar nas terras férteis dos vales dos rios Tigre e Eufrates (Sl 136/7), de sol a sol, produzindo alimentos e abrindo vales. Muitos estavam desamparados e enfraquecidos (Is 40:29), sem esperança para o futuro.

 

23. Esse grupo era composto por funcionários de segunda categoria do templo, trabalhadores civis, pequenos comerciantes, artesãos e agricultores (2Rs 25,11-12). Os capítulos 40 a 55 do livro de Isaías, conhecidos como Segundo Isaías, foram escritos por esse grupo e descrevem a situação deles no exílio (Is 41,17 e 42,22). Nesse contexto desafiador, o Segundo Isaías apresentou uma mensagem de esperança e solidariedade, incentivando os deportados a apoiarem-se mutuamente, compartilhando o fardo e buscando a vida e a libertação (Is 41,13-14).

 

24. Esse grupo manteve viva a chama da vida, mesmo diante da ameaça de extinção e desolação foram eperimentando uma coisa muito bonita: dor partilhada fica mais leve e abre caminhos de esperança. Do desespero o grupo passou a olhar para a frente, enfrentando e superando barreiras. Eles introduziram a figura do “Servo” como um líder justo e compassivo, comprometido com a justiça e a libertação dos oprimidos distinto dos tiranos e reis injustos (Is 42,1-3; 6-7). O “Servo” emerge como um líder sensível às realidades desumanas, caracterizado pelo amor solidário e pelo compromisso com os pobres e oprimidos. Ele atua de maneira oposta ao sistema injusto e explorador, rejeitando o uso da força e da violência. Este é o caminho da humanização e da não-violência, um projeto que mais tarde seria incorporado por Jesus de Nazaré como o “Servo”, em contraste com o império.

 

25. É nesse contexto que a imagem do Bom Pastor começa a ser aplicada a Deus Javé, como por exemplo: Jr 23,1-4; Is 40,1-11; Ez 34. O Salmo 23 foi escrito no final do exílio na Babilônia. Historicamente, o título de pastor era atribuído aos reis, que tinham o dever de garantir alimento e água para seu povo, defender os mais fracos e punir aqueles que os prejudicavam. No entanto, os reis de Judá falharam, cometendo injustiças que levaram à destruição, ao exílio e ao sofrimento do povo (22,23-31). Esses maus pastores usaram seu poder não em benefício das ovelhas fracas, mas em seu próprio interesse. Diante dessa realidade de sofrimento e abandono do povo no exílio, Javé mesmo se revela como pastor libertador, protetor e guiar que conduzirá seu povo de volta à sua terra, pastoreando-o com justiça e retidão (34,1-16). Conheça a história do Salmo 23 digitando no youtube: Salmo 23 - Rodrigo Silva. 

 

26. Em meio a realidade de abandono e sofrimento o grupo de Ezequiel sonha e transforma Javé o Deus de Israel no Bom Pastor para libertar e conduzir seu povo a cidade santa de Jerusalém. Esse grupo insiste em apresentar um projeto do reconstrução da monarquia davídica com um governo que servisse ao Deus do templo de maneira fiel, comprometido com o bem-estar do povo, estabelecendo uma aliança de paz perpétua (37, 21-28). Enquanto isso a elite da primeira deportação procura manter o sonho de reconstruir a monarquia davídica com Javé oficial do templo nos mesmos moldes com o qual deixaram antes de irem para o exilio.

 

27. Por volta do ano 550 a.C., Ciro, imperador da Pérsia, superou a Babilônia e foi bem recebido pelo grupo de Isaías, que passou a sonhar com a possibilidade de retornar a Jerusalém (Is 45,1-8). Essa volta foi considerada um novo Êxodo (Is 55,12-13). No entanto, o projeto de constituição de uma nova monarquia davídica, idealizada pelo grupo de Ezequiel, foi reprimido pelo Império Persa, que se tornou o novo senhor mundial pós-exílio. Os sacerdotes assumiram o poder político, configurando a teocracia no período pós-exílio, especialmente com Esdras e Neemias. Israele que na sua origem era politeísta e na época de Josias passou a ser monalatrico, passou a ser monoteísta. Esse sistema teocrático mais tarde moldaria o sinédrio que vai condenar Jesus de Nazaré, no tempo do império romano. Hoje, a missão cristã de realizar o projeto do Jesus Servo, que cria uma verdadeira rede de solidariedade para os que sofrem e estão enfraquecidos, continua sendo um desafio tanto no passado quando no presente.

 

28- O livro de Ezequiel, com seus 48 capítulos, pode ser dividido em cinco partes distintas, oferecendo uma visão organizada e abrangente da mensagem profética contida em sua obra. Cada seção aborda aspectos específicos da situação histórica e espiritual do povo de Israel durante uma das fases mais atribuladas e trágicas de sua história. O reino de Judá, no sul de Israel, se encontrava envolvido em uma disputa internacional, sem condições de interferir em seu próprio destino. De um lado, o Império Babilônico; do outro, o reino do Egito e no meio estava Judá, fraco e indefeso, tentando equilibrar-se entre essas potências. A consequência desastrosa desse jogo de poderes foi o exílio e a destruição do país, incluindo sua capital Jerusalém.

 

I - 1,1-3,21

II- 3,22-24,27

III- 25-32

IV- 33-39

V- 40-48

Vocação do profeta

Oráculos sobre a destruíção de Jerusalém

Oráculos contra as nações

Oráculos de salvação para Israel

Visão da nova Jerusalém e do povo restaurado

 

I e II - Oráculos de julgamento contra Jerusalém (1-24): Após apresentar sua vocação, Ezequiel utiliza gestos simbólicos para anunciar o cerco e a destruição de Jerusalém. Ele descreve aos exilados o castigo dos "lugares altos", santuários onde ocorre adoração de ídolos, injustiça e violência, os quais serão devastados pelos invasores sem possibilidade de ajuda, seja dos sacerdotes, anciãos ou rei. Devido às abominações cometidas, a glória de Javé se afasta tanto do templo quanto da cidade. Por meio de alegorias e gestos simbólicos, o profeta anuncia o juízo sobre Israel, denunciando os falsos profetas e a idolatria, e enfatiza a responsabilidade pessoal diante de Deus, que recompensa cada um conforme suas ações. A parábola da vinha ilustra os habitantes de Jerusalém como uma vinha infiel e inútil, seguida pela narrativa do casamento, onde Jerusalém é retratada como esposa infiel a Javé.

 

III - Oráculos contra as nações estrangeiras (25-32): Nestes capítulos, são proferidos oráculos contra as nações inimigas e vizinhas de Israel: Amon, Moabe, Edom, Filisteia, Egito, Tiro e Sidom. Essas nações não apenas se aproximaram da queda de Jerusalém, mas também se alegraram com isso e contribuíram com a pilhagem do país.

 

VI - Anúncios de salvação para o povo de Israel (33-39): A função do profeta é ser sentinela para a casa de Israel, chamando o povo a mudar de comportamento e a viver. Além disso, procura animar o povo exilado e alimentar a esperança do retorno. O profeta denuncia os falsos pastores de Israel, que cuidam apenas de si mesmos. Deus é visto como o verdadeiro pastor de Israel, reunindo, cuidando e guiando suas ovelhas. No capítulo 37, encontramos a famosa alegoria dos ossos secos, simbolizando a situação desoladora de Israel no exílio, um episódio repleto de esperança. Quando a vida parece não ter mais chance, o espírito de Deus sobre, traz recreação e restauração ao povo. O espírito de Deus sopra, recria e restaura o povo. O espírito de Deus reanima a esperança e faz reviver. A palavra de Javé vence a morte.

 

V- Visão da nova Jerusalém e do povo restaurado (40-48): A última parte do livro descreve minuciosamente a visão utópica da nova realidade de Jerusalém e do seu templo após o retorno do exílio. Após o afastamento, a glória de Javé retornará à cidade santa, onde viverá eternamente no meio dos filhos de Israel. Do altar surgem águas abundantes, símbolo de vida abundante. O templo é visto como a fonte da bênção divina.

 

Pesquise nesse site sobre Reino do Norte: https://leituraorante.comunidades.net/134-o-reino-do-norte-e-seus-profetas-931-a-722-ac

Pesquise nesse site sobre Reino do Sul: https://leituraorante.comunidades.net/135-o-reino-do-sul-e-seus-profetas-931-587-ac

Pesquise nesse site sobre Exilio: https://leituraorante.comunidades.net/136-exilio-da-babilonia-aprox-587-6-538-ac

Pesquise nesse site sobre Pós- Exilio: https://leituraorante.comunidades.net/137-pos-exilio-dominacao-persa-538-333-ac

 

Bibliografia

NAKANOSE, Shigeyuki; Maria Antonia: Centro Biblico Verbo Divino. Restauração da Monarquia Davidica e da Terra de Israel - Entendendo o Livro de Ezequiel. São Paulo: Paulus, 2024

 

MESTERS, Carlos; Francisco Orofino: Cebi. Fogo debaixo das cinzas - Circulos Biblicos do livro do profeta Ezequiel. São Leopoldo, 2024.

 

LUZA, Nilo; Paulo Barzaglia: “Colocarei em vocês o meu Espírito e vocês reviverão” (Ez 37,14)- Encontros para o Mês da Biblia - São Paulo: Paulus, 2024

 

SERVIÇO DE ANIMAÇÃO BIBLICA - SAB. Porei em vós meu Espírito e vivereis” (Ez 37,14) - Livro de Ezequiel - Texto para o povo. São Paulo: Paulinas, 2024

 

LIVRO DE EZEQUIEL - “Porei em vós meu Espírito e vivereis” (Ez 37,14) - Texto-Base - Edições CNBB, 2024