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6ª Aula A esperança anima a caminhada (Mq 4,1-5)
6ª Aula A esperança anima a caminhada (Mq 4,1-5)

 

1- Acolhida

Preparemo-nos para a nossa última aula, colocando-nos na presença de Deus, oferecendo os frutos que colhemos nesta caminhada com o livro de Miqueias. Que o Deus da Paz nos inspire atitudes de esperança e de solidariedade para com todas as pessoas que sofrem. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.

 

Jesus Mestre, que dissestes: "Onde dois ou mais estiverem reunidos em meu nome, eu aí estarei no meio deles", ficai conosco, aqui reunidos (pela grande rede da internet), para melhor meditar e comungar com a vossa Palavra. Sois o Mestre e a Verdade: iluminai-nos, para que melhor compreendamos as Sagradas Escrituras. Sois o Guia e o Caminho: fazei-nos dóceis ao vosso seguimento. Sois a Vida:  transformai nosso coração em terra boa, onde a Palavra de Deus produza frutos abundantes de santidade e missão.

 

 

Junto com o poeta e cantor Zé Vicente cantemos:  

 

"Quando o dia da paz renascer, quando o sol da esperança brilhar, eu vou cantar. Quando o povo nas ruas sorrir e a roseira de novo florir, eu vou cantar.

 

Quando as cercas caírem no chão, quando as mesas encherem de pão, eu vou cantar. Quando os muros que cercam os jardins forem destruídos, então os jasmins vão perfumar

 

Vai ser tão bonito de ouvir a canção cantada de novo. No olhar da gente a certeza do irmão, reinado do povo.

 

Quando as armas da destruição, destruídas em cada nação, eu vou sonhar.E o decreto que encerra a opressão, assinado só no coração, vai triunfar. Quando a voz da verdade se ouvir e a mentira não mais existir, será, enfim, tempo novo de eterna justiça, sem mais ódio, sem sangue ou cobiça, vai ser assim.

 

Vai ser tão bonito de ouvir a canção cantada de novo. No olhar da gente a certeza do irmão, reinado do povo".

 

**************************

 

2- Motivando a aula de hoje:

 

Muitas pessoas refugiadas encontram espaço no Brasil para viver em paz. Não vivemos em uma guerra declarada, mas às vezes empreendemos uma guerra fria com nossos vizinhos, amigos e parentes. Por ano morrem mais de cinquenta mil pessoas por arma de fogo. Como podemos fazer de nossa casa e de nossa comunidade espaços para viver em paz? O que podemos fazer para as pessoas que se encontram refugiadas em nosso país?

 

3- Situando o texto

 

Os capítulos 4 e 5 do livro de Miqueias, que iremos estudar hoje, são textos tardios e refletem o desejo dos habitantes da cidade de Jerusalém destruída. Quando os exércitos de Nabucodonosor, rei da Babilônia, invadiram e devastaram Jerusalém, em 587 a.C., uma parte da população foi exilada. Foi um desastre nacional! "Jerusalém recorda os dias de miséria e aflição, quando seu povo caía em mãos do inimigo” (Lm 1,7). Porém, o povo não perde sua esperança teimosa pela vida. Aos poucos, ele se organiza e nasce a ideia de um resto, que se entende como povo eleito (4,6-8; 5,6-7). E começa a sonhar com o fim do exílio, a restauração de Jerusalém e do templo e Javé, como rei presente no meio do povo (Sf 3,11-17). Ao contrário da posição histórica de Miqueias, que pregava a destruição de Jerusalém, em fins do século VIII a.C., esses capítulos têm como centro a restauração de Jerusalém e do templo, no século VI a.C. Reaviva o sonho de um mundo sem guerras. Sonhando com um mundo de paz e no desejo da paz que é vida em abundância para todas as pessoas, vamos abrir nossa bíblia e ler o texto de  Mq 4,1-5 e responder as seguinte perguntas:

 

1- Qual é a realidade que transparece no texto?

 

2- Como será a Jerusalém restaurada?

 

3- Qual é a esperança que anima a vida do povo?

 

O sonho de todas as pessoas é ter condições de vida digna: casa, trabalho, educação, amigos e família. A sociedade de consumo faz surgir em nós muitas necessidades e nos deixa eternamente insatisfeitos.

 

a) Quais são os nossos sonhos? Use a caixa de diálogo, no final da lição, e partilhe seu sonho com os demais colegas.

 

b) Como estamos exercendo a nossa solidariedade para com as pessoas sofridas como refugiadas?

 

c) Qual é a sociedade com que sonhamos? E o que estamos fazendo para concretizar uma sociedade justa e fraterna?

 

3.1 - Situando o texto: Contexto do exílio da Babilônia

 

Naquele dia — oráculo de Javé — ajuntarei as ovelhas mancas, reunirei as que foram dispersadas, e aquelas que eu mesmo castiguei. Farei das estropiadas um resto, e das dispersas uma nação forte. E, no monte Sião, Javé reinará sobre elas, desde agora e para sempre. E você, Torre do Rebanho, colina da filha de Sião, a você virá, retornará a soberania de antes, a realeza da filha de Jerusalém (Mq 4,6-8).

 

Os capítulos 4 e 5 de Miqueias são textos tardios e refletem a restauração do resto disperso, sofrido e abatido por causa do desastre nacional do exílio. Javé como pastor castigou o rebanho por sua infidelidade, mas novamente o reunirá no monte Sião, restaurando a soberania do povo de Israel.

 

 Ao contrário das mensagens do profeta Miqueias, condenando Jerusalém e o templo (3,9-12), esses capítulos apresentam a centralidade da cidade de Jerusalém (Sião) na ação salvífica de Javé: a teologia de Sião.

Para compreender essa teologia com promessas de renovação para Sião e perseguição violenta contra seus “inimigos” (5,8-14), é preciso retomar o acontecimento do exílio e os movimentos de restauração:

 

Nossa pele queima como forno, torturada pela fome. Violentaram as mulheres em Sião e as virgens nas cidades de Judá. Com suas mãos esganaram os chefes e não respeitaram os anciãos. Forçaram os jovens a girar o moinho, os rapazes sucumbiram sob o peso da lenha. Os anciãos já não participam do Conselho e os jovens deixaram seus instrumentos de corda. Acabou a alegria que nos enchia o coração, nossa dança se mudou em luto. Caiu a coroa da nossa cabeça. Ai de nós, porque pecamos! (Lm 5,10-16).

 

O livro de Lamentações descreve a devastação de Jerusalém provocada pela invasão de Nabucodonosor, rei da Babilônia, em 587 a.C.: saques, incêndios, matanças, deportação, violência física e sexual, fome, sede... O povo judeu, especialmente os habitantes de Jerusalém, perde seus referenciais: a cidade santa (Lm 1,1-4; 2,8; 5,18), o templo (Lm 1,10; 2,7), a dinastia davídica caem por terra (Lm 4,20; 5,16). Uma realidade de sofrimento físico e existencial: “A cidade de Jerusalém perdeu toda a sua beleza” (Lm 1,6).

 

A situação é desoladora. Parece sobrar pouco fôlego para o futuro. Mas a força da vida que existe no ser humano é muito mais forte e o coloca de pé novamente. As pessoas arrancam suas últimas energias e se põem a sonhar, a acreditar na vida, mesmo em meio à realidade de destruição. Os ex-habitantes de Jerusalém não perdem ainda, por exemplo, a capacidade de gritar a sua dor. Os gritos ecoam em todo o livro: “Vocês todos que passam pelo caminho, olhem e prestem atenção: haverá dor semelhante à minha dor?” (Lm 1,12). Mesmo no fundo do poço, o povo tem esperança.

 

No âmago da dor e da desolação, um grupo remanescente grita, luta e tenta manter a chama da vida, recordando o amor de Javé: “A misericórdia de Javé nunca se acaba, e sua compaixão não tem fim” (Lm 3,22). Fortalece a fé em Javé: ele “é bom para os que nele esperam e o procuram. E bom esperar em silêncio a salvação de Javé. E bom para o homem suportar o jugo desde a juventude. Que esteja sozinho e calado, quando cai sobre ele a desgraça; que ponha sua boca no pó: talvez haja esperança” (Lm 3,25-29). E parte para a luta pela sobrevivência.

 

Mantendo sua esperança, eles promovem o culto nas ruínas do templo de Jerusalém: “No dia seguinte ao assassinato de Godolias, ninguém ainda sabia. Foram então uns oitenta homens de Siquém, de Silo e da Samaria, com a barba raspada, roupas rasgadas e ferimentos no corpo. Levaram ofertas e incenso para a Casa de Javé” (Jr 41,4-5). Retomam o serviço religioso: peregrinação, culto e oferta. E a luta pela sobrevivência. A vida começa a ressurgir...

 

Afinal, podemos nos perguntar: quem escreveu o livro de Lamentações? Quem estaria pronunciando, escrevendo, propagando e liderando esse movimento religioso a partir de Sião? Uma vez que o culto nas ruínas do templo desempenha um papel importante, a liderança do movimento talvez estivesse nas mãos dos levitas, ex--funcionários de segunda categoria do templo.

 

Eles haviam sido os sacerdotes levitas dos santuários do interior onde outrora prestavam serviço à população, ajudando na organização das aldeias e do culto com a teologia tribal (Os 4,4-14). Porém, na ocasião da reforma de Josias, por volta de 620 a.C., muitos levitas foram perseguidos e submetidos ao controle do templo de Jerusalém. Uma parte deles foi trazida a Jerusalém para funções secundárias no templo sob as ordens dos sacerdotes oficiais da casa davídica, os “sadoquitas" (2Sm 8,17; 2Rs 23,8-9).

 

Desde a sua chegada forçada a Jerusalém, os levitas dos santuários, que viviam da renda das oferendas do templo, também assimilaram a teologia de Sião, o lugar central da manifestação de Deus: “Javé fez cair no esquecimento sábados e festas em Sião; indignado e cheio de ira, rejeitou rei e sacerdote” (Lm 2,6); “Grite de coração ao Senhor, ó muralha da filha de Sião” (Lm 2,18); “No monte Sião haverá sobreviventes. Eles serão santificados” (Ab 17).

 

Na queda de Jerusalém, um grupo de levitas permaneceu nas ruínas de Jerusalém e ao redor da cidade de Belém, um possível centro de clãs levitas (cf. Jz 17,7-9). Com o serviço religioso e cultuai, os levitas apontam a saída para os sobreviventes da catástrofe nacional: organizam e promovem os cultos nas ruínas de Jerusalém, criando assim o trabalho, a renda e a identidade para os ex-funcionários da capital.

 

Além de tudo, os levitas de Sião aprofundam e renovam a teologia que transparece, por exemplo, nos textos acrescentados ao livro de Sofonias:

 

Deixarei em você um resto, um povo pobre e fraco, que se refugiará no nome de Javé. O resto de Israel não praticará mais a injustiça nem contará mentiras; não se encontrará mais em suas bocas uma língua mentirosa. Eles poderão pastorear e repousar, e ninguém os incomodará. Grite de contentamento, filha de Sião! Alegre-se, Israel. Fique alegre e exulte de todo o coração, ó filha de Jerusalém! Javé mudou a sentença que tinha contra você, eliminou seu inimigo. Javé, o rei de Israel, está no meio de você. E você nunca mais verá a desgraça (Sf 3,12-15).

 

No oráculo de restauração, o grupo de Sião utiliza os dois conceitos teológicos: “Resto” e “Javé como o rei de Israel”. Por um lado, o conceito de “resto” (os sobreviventes), que se origina nas catástrofes, manifesta para eles a graça divina e leva-os a se entender como o povo eleito; de outro, Javé, como o rei, está presente no meio do povo, em oposição ao rei humano, vivendo no palácio. Os dois conceitos, que emergem numa situação de crise, apontam uma saída para os sobreviventes de Jerusalém, apascentados e conduzidos por um Deus rei, pastor e libertador (cf. Sl 23,1).

 

Com a presença do Deus libertador, a alegria volta e contagia a vida do povo: “Javé, o seu Deus, o valente libertador, está no meio de você. Por causa de você, ele está dançando de alegria por sua causa, como em dias de festa” (Sf 3,17-18a). Há vida: peregrinação, culto, hospedagem, comércio, festa... E o grupo de Sião começa a sonhar mais: “De suas espadas vão fazer enxadas, e de suas lanças farão foices. Um povo não vai mais pegar em armas contra outro; nunca mais aprenderão a fazer guerra” (4,3b).

 

Na redação final, os capítulos 4 e 5 foram acrescentados ao livro de Miqueias; foram compostos na época pós-exílica, com ênfase na Lei e na centralidade de Jerusalém. Porém, o texto também contém a mensagem do grupo levita, que experimentou a realidade da guerra e o desastre nacional do exílio, e agora tenta reconstruir a identidade e o projeto do povo: sonhar com um mundo de prosperidade, segurança e paz. Vamos acompanhar a mensagem de esperança desse grupo, que transparece em Mq 4,1-5.

 

3.2 - Comentando o texto: Mq 4,1-5 — “De suas espadas vão fazer enxadas"

 

Ter o necessário para viver com dignidade é um sonho que está presente em todos os tempos e renasce, com muita força, nos momentos de destruição. É a esperança e a fé na vida que sempre resistem. Na Bíblia, há muitas passagens que projetam uma sociedade na qual as pessoas possam viver em paz e segurança.

 

O grupo do Terceiro Isaías, por volta do ano 450 a.C., proclama: “Vejam! Eu vou criar céus novos e terra nova. As coisas antigas não serão lembradas nem subirão ao coração. Por isso, fiquem para sempre alegres e contentes, por causa do que vou criar; pois eis que eu estou criando para Jerusalém uma alegria, e para seu povo um regozijo. Exultarei com Jerusalém e me alegrarei com o meu povo. E nela nunca mais se ouvirá choro e clamor” (Is 65,17-19). Diante da situação de pessoas pobres, miseráveis e famintas, o grupo de levitas — sacerdotes que outrora prestavam serviço à população nos santuários do interior — apresenta o sonho de uma nova sociedade de paz, igualdade e solidariedade:“Construirão casas e nelas habitarão, plantarão vinhas e comerão seus frutos” (Is 65,21).

 

Acontece que o mesmo grupo já tinha proclamado um sonho de paz, harmonia e alegria no período do exílio, depois da destruição de Jerusalém, em torno de 587 a.C. Após a invasão de Jerusalém pela Babilônia, houve mortes, destruição, deportação e muitos outros sofrimentos. Os principais referenciais do povo caíram por terra: o rei foi torturado, preso e morto; o templo, invadido e saqueado. Jerusalém foi devastada: saques, incêndios, matanças, fome, sede... como o livro de lamentações descreve: “O monte de Sião (Jerusalém) está devastado” (5,18).

 

Apesar disso tudo, surge um oráculo de esperança e confiança em Javé: “Nos últimos dias, acontecerá que o monte do Templo de Javé ficará firme no topo das montanhas e se elevará acima das colinas. Para lá correrão os povos” (4,1).

 

O grupo de levitas continua insistindo na presença de Javé, o Deus forte, concepção também presente em alguns salmos: “Deus é nosso refúgio e nossa força. Entre muitos perigos, nele sempre encontramos socorro. Por isso, não tememos se a terra treme ou se as montanhas afundam no coração dos mares” (SI 46,2-3; cf. SI 48; 76).

 

Ao insistir na centralidade de Jerusalém com Javé poderoso, o grupo destrona o Deus da Babilônia, o império invasor. No domínio babilônico, o templo do Deus Bel era o centro de peregrinação das nações, porém esse centro será destruído, como vemos na releitura do profeta Jeremias: “Acertarei contas com o deus Bel na Babilônia. Tirarei de sua boca tudo o que ele engoliu. Nunca mais as nações irão para ele. Até as muralhas da Babilônia cairão” (Jr 51,44). A proposta é que o templo de Javé seja reconhecido como o centro e a casa de todos os povos.

 

E o convite é atraente: “Vamos subir para o monte de Javé, para o Templo do Deus de Jacó. Aí aprenderemos seus caminhos, para seguirmos seus rumos” (4,2a). E o grupo expõe o motivo de todas as nações irem para Jerusalém: “de Sião sairá a lei e de Jerusalém virá a Palavra de Javé!” (4,2b; cf. Is 51,3-4). O sonho de que Jerusalém será o centro e para lá irão as nações está presente em grupos proféticos do pós-exílio (Is 60,5-7; Ag 2,7; Zc 8,20-23; SI 72).

 

Javé será o juiz para as nações poderosas e a paz reinará: “De suas espadas farão enxadas, e de suas lanças farão foices” (4,3). No reinado de Javé não haverá mais guerras (Os 2,20). As armas serão transformadas em instrumentos de trabalho que produzirão alimentos para manter a vida. Guerra jamais! E uma crítica contra o militarismo do Estado e o sonho de muitas pessoas que já experimentaram a realidade da guerra, como podemos ouvir na voz de muitos refugiados em nosso país.

 

As pessoas experimentarão segurança e prosperidade no reinado de Javé e poderão “sentar-se debaixo de sua vinha e de sua figueira sem ser perturbadas” (4,4). Vinhas e figueiras, que são plantas básicas na economia de Judá, necessitam de cuidados: as pessoas não mais irão para a guerra e terão tempo para cuidar de sua plantação e usufruir de seus frutos. E Javé que garante a paz, e não os reis (2Rs 18,31; Zc 3,10).

 

Ao longo da história do povo de Israel, diversos grupos protestaram contra a monarquia. Na Bíblia, há uma fábula que expressa essa resistência: diversas arvores se reuniram para eleger quem dentre elas seria o rei. Todas, como as “vinhas e as figueiras”, se recusaram, afirmando que não iriam renunciar à produção de seus frutos para ficar balançando sobre as outras. A única que aceitou foi o espinheiro, que ainda promete proteção sob a sua sombra — espinheiro não tem sombra — e castigo para os que o rejeitarem (cf. Jz 9,8-15).

 

Essa fábula é uma crítica severa contra o Estado. O espinheiro representa a “força” dos reis (de Judá e da Babilônia) que acabou desembocando na destruição da nação. Por isso, o autor de Mq 4,3-4 é totalmente contra a violência. Tendo experimentado a realidade de guerra, surge a esperança “ardente”: segurança, paz e prosperidade. Ou seja, o sonho do povo de viver na fraternidade: “Nesse dia — oráculo de Javé dos exércitos —, cada um de vocês poderá convidar seu vizinho para vir debaixo da sua própria vinha e debaixo da sua própria figueira”, diz Zc 3,10.

 

Enfim, o oráculo de sonho termina da seguinte forma: “Todos os povos caminham, cada qual em nome do seu deus. Nós, porém, caminhamos em nome de Javé, nosso Deus para sempre” (4,5). Após a declaração de que Javé castiga as nações poderosas e restaura a paz, o autor reafirma sua fé e caminhada com seu Deus: Deus de paz e de fraternidade. Não os deuses de ambição, violência, opressão e guerra dos reis!

 

O tempo do exílio: a cidade de Jerusalém devastada; o estado de abandono e de desolação; perda de casa e terra; órfãos e viúvas abandonados; violência física e sexual, fome, sofrimento e decepção; fim da alegria... Apesar disso tudo, a esperança teimosa faz o povo sonhar de novo. Faz afirmar que há sim a vida para todas as pessoas. A certeza de que Javé garante a vida digna anima a caminhada do povo de ontem e de hoje: “Nós caminhamos em nome de Jesus, nosso Verbo encarnado para sempre!”. Entremos na caminhada.

 

3.4 Aprofundando: O projeto de esperança dos levitas exilados

 

Seu povo é um povo espoliado e roubado, todos presos em cavernas, trancado em prisões. Era saqueado, e ninguém o libertava. Despojado, e ninguém dizia: “Devolvam isso” (Is 42,22).

 

Em 589 a.C., Sedecias rebelou-se contra a Babilônia. Nabucodonosor sitiou Jerusalém e, um ano e meio depois, entrou na cidade. Dessa vez, a ação militar do império foi violenta. Foi uma catástrofe: a cidade foi destruída e o templo, saqueado, profanado e incendiado. Nabucodonosor não teve compaixão alguma com as autoridades e os habitantes de Jerusalém. A família real e seus partidários notáveis foram aniquilados. O grupo de funcionários públicos do templo, incluindo os levitas, trabalhadores civis, pequenos comerciantes, artesãos e agricultores, foi levado como prisioneiro para o exílio (2Rs 25,11-12). Foi a segunda deportação (587 a.C.).

 

O grupo foi tratado como escravo e despojo de guerra: espoliado, saqueado e perseguido (cf. Is 42,7; 47,6; 50,6), pobres e indigentes, necessitados de tudo, também da água (cf. Is 41,17; 5 5,1). Alguns ainda carregam o peso da religião, pois acreditam que o exílio é castigo de Javé pelo pecado (cf. Is 40,2). E eles estão controlados e até seduzidos pelos deuses da Babilônia.

 

Na Babilônia, a religião é estruturada no panteão de Marduk, deus supremo que subjuga os deuses de diversas cidades com seus santuários, como no campo político no qual a capital do reino subjuga e explora as cidades e os campos. O panteão, assim, é espelho e legitimação religiosa da estratificação socioeconômica do império, ou seja, a sociedade piramidal!

 

Diante dessa situação, o grupo dos levitas exilados, o autor de Segundo Isaías (Is 40-55) critica e anula a teologia babilônica do politeísmo e apresenta a religião monoteísta de Javé:

 

Assim diz Javé, o Rei de Israel, seu protetor, Javé dos exércitos: Eu sou o primeiro, eu sou o último. Fora de mim não existe outro Deus. Existe alguém como eu? Que fale, que o explique e o exponha a mim. Quem anunciou o futuro de antemão, quem nos predisse o que vai conhecer? Não tenham medo, não tremam. Por acaso desde aqueles tempos eu já predisse e anunciei? Vocês são minhas testemunhas: existe outro Deus além de mim? Pelo que eu saiba, não existe nenhuma outra Rocha (Is 44,6-8).

 

O texto é, sem dúvida, uma das primeiras afirmações do monoteísmo universal de Javé, na história de Israel: “eu sou: nenhum Deus existiu antes de mim, e depois de mim nenhum outro existirá” (Is 43,10). Uma reviravolta teológica! No meio dos deportados sofridos na Babilônia, surge a religião monoteísta como força alternativa de superação e oposição à religião do império. Ao insistir no poder de Javé, o único Deus, os levitas repudiam e anulam a religião do politeísmo de Marduk, vanguarda do Império Babilônico. Abrem-se, assim, com o Segundo Isaías e depois, em particular, com o Terceiro Isaías, o projeto da esperança, ou seja, as perspectivas da saída do exílio e a reconstrução de Israel com o espírito dos levitas:

 

a) Novo êxodo: “Assim diz Javé, aquele que abriu um caminho no mar, uma passagem entre as ondas violentas, aquele que fez sair o carro e o cavalo, o exército e os valentes. Eles caíram para não mais se levantar, apagaram-se como pavio que se extingue. Não fiquem lembrando o passado, não pensem nas coisas antigas. Vejam que estou fazendo uma coisa nova: ela está brotando agora, e vocês não percebem? Abrirei um caminho no deserto, rios em lugar seco” (Is 43,16-19). O grupo do Segundo Isaías faz uma releitura do êxodo e anuncia a libertação da escravidão da Babilônia. O próprio Javé caminhará à frente do seu povo sofrido e enfraquecido (Is 52,12), que sairá na paz e na alegria (55,12).

 

b) Deus de ternura: “Porque eu sou Javé, o seu Deus, que o sustento pela mão direita e lhe digo: 'Não tenha medo. Eu mesmo o ajudarei’” (Is 41,13). Em contraste com Marduk, deus violento e sanguinário, Javé é apresentado como deus solidário (Is 40,1.29; 41,10; 43,5; 51,12), compassivo (Is 49,13; 52,9), próximo (Is 43,1.7; 45,3-4; 49,1.16). Ele é pastor que apascenta e conduz seu povo: “Como um pastor, ele cuida do rebanho, e com seu braço o reúne. Leva os cordeirinhos no colo e guia mansamente as ovelhas que amamentam” (Is 40,11); “Não passarão fome nem sede. Não serão molestados pelo calor nem pelo sol, pois aquele que se compadece deles os conduzirá e os guiará para onde há fontes de água” (Is 49,10).

 

c) Nova liderança: “Eu, Javé, chamei você para a justiça, tomei-o pela mão, e lhe dei forma, lio coloquei como aliança de um povo e luz para as nações, para você abrir os olhos dos cegos, para libertar os presos da cadeia, e do cárcere os que viveu i no escuro” (Is 42,6-7). O grupo do Segundo Isaías lança um olhar sobre a história e constata que há muitos anos o povo vem sendo oprimido pela tirania dos grandes impérios e explorado pelos próprios governantes da monarquia. A pari ir de sua memória das aldeias comunitárias e lambem de sua experiência da sobrevivência comunitária dos exilados escravos, o grupo projeta uma nova liderança, o "Servo", com características diferentes dos tiranos e dos reis injustos: liderança baseada no amor, na ternura, na gratuidade, na não violência; na justiça, na solidariedade e, sobretudo, no maior cuidado com os sofridos (Is 42,1-9; 49,1-6; 50,4-11).

 

d) Nova Aliança: “Atenção! Todos os que estão com sede, venham às águas. E os que não têm dinheiro, venham. Comprem e comam sem dinheiro, e bebam vinho e leite sem pagar. Por que gastar dinheiro com aquilo que não é pão, e o produto do trabalho com aquilo que não traz fartura? Ouçam-me com atenção, e comerão bem e saborearão pratos suculentos. Deem ouvidos a mim, venham para mim, me escutem, que vocês viverão. Farei com vocês uma aliança definitiva, serei fiel à minha amizade com Davi” (Is 55,1-3). A aliança agora não será mais entre Deus e o rei da casa davídica, mas com toda a comunidade. O sonho do grupo é restabelecer uma sociedade na qual reina o projeto da partilha e solidariedade.

 

e) Nova Jerusalém: “Ó aflita, açoitada pela tempestade e desconsolada! Veja! Eu assento seus muros sobre pedras preciosas e faço de safira a base. As muralhas eu faço de rubi, e as portas de esmeralda. Toda a sua muralha eu faço de pedras preciosas. Seus filhos todos serão discípulos de Javé. Será grande a paz de seus filhos. Você será estabelecida com justiça, longe da opressão, e não terá o que temer. Ficará longe do terror, que nunca mais se aproximará de você” (Is 54,11-14: cf. Ap 21,15-27). A reconstrução de Jerusalém é um dos principais temas dos levitas que tinham trabalhado no templo, desde o reinado de Josias. Porém, a nova Jerusalém será reconstruída na justiça, na solidariedade e na paz: "Céus, gotejem lá de cima, e as nuvens chovam a justiça. Que a terra se abra e produza a salvação, e junto com ela brote a justiça. Eu, Javé, eu as criei” (Is 45,8; 52,9; 54,10).

 

Do ponto de vista da reconstrução do país, o grupo do Segundo Isaías, os levitas exilados, se assemelha muito ao projeto dos seus irmãos levitas remanescentes, o grupo de Sião: “O resto de Jacó estará no meio de povo numerosos, como o orvalho que vem de Javé ou a chuva sobre a grama verde. Estes não colocam sua esperança no homem, e não dependem do ser humano” (Mq 5,6).  O resto de Jacó (=Israel) deve abandonar a ilusão da força do ser humano — a monarquia militarista (cf. Mq 4,15), para se apoiar na força e gratuidade de Javé, simbolizadas pelo "orvalho” (Os 14,6).

 

Em meio à crise generalizada do exílio, os grupos levitas ajudaram o povo a sobreviver, criando novos modos de pensar, proclamar, executar e sonhar por uma sociedade na qual todas as pessoas tenham condições dignas de vida. E a semente do projeto das aldeias comunitárias.

 

Após o exílio, porém, a esperança pelo novo êxodo, como o sonho do grupo do Segundo Isaías, será pisoteai f 1 pela dominação do Império Persa. A história se repele, como no tempo da monarquia (Mq 3,9-11)! Ciro, que é chamado de "salvador” e recebe o título de "ungido de Javé”, espalhará a semente do imperialismo: o Império Persa e seus súditos, como Neemias e Esdras, com sua teologia oficial, exploram e oprimem o povo: “Arrancam o órfão do peito materno e penhoram quem é pobre. Da cidade sobem os gemidos dos moribundos e, suspirando, os feridos pedem socorro, e Deus não dá ouvido a essa infâmia” (Jó 24,9.12). A teologia oficial de Javé sua lei do puro e do impuro perpassam a história e chegam ao Sinédrio do tempo de Jesus, e até as instituições religiosas de hoje.

 

Mas é preciso dizer também que os tiranos não conseguem aniquilar os movimentos de resistência:

 

Como a chuva e a neve que caem do céu, para lá não voltam sem antes molhar a terra, tomando-a fecunda e fazendo-a germinar, a fm de produzir semente para o semeador e alimento para quem come, assim acontece com a minha palavra, que sai de minha boca. Ela não volta para mim sem efeito, sem ter realizado o que eu quero, e sem ter cumprido com sucesso a missão para a qual eu a enviei (Is 55,10-11).

 

A Palavra de Deus tem a força de gerar nova vida (Is 40,8). O sonho do Segundo Isaías e de outros tem, sem dúvida, “efeito” no meio do povo e em sua história. As palavras de resistência e encorajamento, que devem ter nascido no coração dos exilados escravos, criaram raízes. Na história pós-exílica, surgem os vários movimentos de resistência contra a sucessiva opressão dos impérios: Persa, Grego e Romano. O texto bíblico testemunha o movimento sapiencial, o apocalíptico, o profético, o de Jesus de Nazaré, “Servo”... É preciso que estejamos sempre dispostos e dispostas a renovar nossa aliança com o Deus da vida, ajudando o povo a se reunir, se organizar e caminhar juntos rumo ao novo êxodo. Que essa certeza possa animar a nossa caminhada na construção do Reino da Vida!

 

4- Celebrando a vida

 

 “De suas espadas vão fazer enxadas, de suas lanças farão foices”.

 

Nosso anseio é o mesmo do povo de Deus: “sentar-se debaixo de sua vinha e de sua figueira” (Mq 4,3b.4a).

 

Nesse momento, vamos agradecer a Deus pelo nosso estudo. Que o Deus da Paz derrame suas bênçãos sobre nós, nossa comunidade, nosso país e sobre o mundo inteiro. Amém!

 

Você tem alguma sugestão de temas para nosso próximo estudo? Partilhe com os demais internautas usando a caixa de comentário logo abaixo e desde já muito obrigado pela sua participação.

 

 

 

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BIBLIOGRAFIA

 

CUFFEY, Kenneth H. The Literary Coherence of the Book  of Micah. Nova York: Bloomsbury, 2015.

FINKELSTEIN, Israel. O reino esquecido — Arqueologia e história de Israel Norte. São Paulo: Paulus, 2015.

KAEFER, José Ademar. A Bíblia, a arqueologia e a história de Israel e Judá. São Paulo: Paulus, 2015.

NOVA BÍBLIA PASTORAL. São Paulo: Paulus, 2014.

SMITH, Ralph. Micah-Malachi. Word Biblical Commenlarv, v 32. Texas: Word Books, 1987.

SICRE, José. A justiça social nos profetas. São Paulo: Paulus, 1990

WILSON, Robert R. Profecia e sociedade no Antigo Testamento. Paulo: Paulus, 1993.

ZABATIERO, Júlio Paulo Tavares. Miqueias: voz dos sem-terra, Petrópolis: Vozes, 1996.