Curso Bíblico Online
"Esperança cristã e segunda vinda do Senhor"
1ª Tessalonicenses 5,12-22
Motivando a aula: Na aula anterior, refletimos sobre a necessidade de viver uma espera ativa, abrindo-nos para a vivência das virtudes que sustentam a vida da comunidade: a fé, o amor e a esperança. Na aula de hoje, a última do nosso curso, vamos refletir sobre as recomendações de Paulo e seus companheiros para a vivência cotidiana da comunidade. Nosso desejo, com essa aula, é que nossas casas e comunidades sejam espaços de vida digna e solidária para todas as pessoas.
Situando o texto: No Império Romano havia muitas associações voluntárias, que garantiam alguma segurança para os seus associados, como identidade, festas, refeições comunitárias e uma divindade protetora, entre outras.
As associações atraem muitas pessoas, sobretudo imigrantes do Oriente Médio e das margens do Mediterrâneo, que vêm ou são forçados a trabalhar nas cidades do Império Romano. São pessoas destituídas de suas famílias, tribos, aldeias, cidades e terras. Mas o que atrai as pessoas? Como funciona a associação voluntária?
Em geral, a associação pode ser classificada em tomo de determinado interesse ou objetivo: a) mesma família (parentesco) ou mesma localidade de origem; b) mesma profissão; c) devoção à mesma divindade. Porém, quase todas as associações têm sua divindade protetora. Por exemplo, a associação de mercadores romanos tem como patrono o deus romano Mercúrio. Ou os navegadores da cidade litorânea de Tiro, na Fenícia, em torno do antigo deus semita Melkart (Héracles, em grego).
Quanto à organização da associação, podemos destacar as seguintes atividades: a) Realizar uma cerimônia de iniciação; b) Organizar convívio, reuniões, festas, sobretudo refeições comunitárias; c) Celebrar o culto a algum deus ou deuses patronos para assegurar a proteção divina, muitas vezes com a oferenda de sacrifícios.
Tudo isso reforça o senso de identidade e solidariedade entre os membros da associação, protegendo e promovendo a vida dos participantes, sobretudo dos trabalhadores menos favorecidos e, muitas vezes, desprezados no mundo greco-romano. As inscrições atestam até as associações de funerários.
Em meio a esse ambiente social, Paulo se tornou itinerante e fundador de comunidades. E ele não fundou “entidades teológicas abstratas”, mas, sim, organizou as comunidades da vida real de homens e mulheres, sobretudo dos pobres menosprezados. Ou, como relata Paulo a respeito da condição de vida dos membros da comunidade de Corinto: “passamos fome e sede, estamos mal vestidos, somos maltratados, não temos morada certa, e nos cansamos trabalhando com as próprias mãos” (1 Cor 4,11-12a). Os pobres ou “lixo do mundo” constituíam a base social do movimento de Jesus que Paulo anunciava e promovia nos centros urbanos do Império Romano.
A condição de vida dos membros da comunidade cristã de Tessalônica, o centro urbano mais importante da Macedônia, não foge à regra. A maioria deles era de origem pagã (1,9) e pobres trabalhadores, que não podiam nem mesmo sustentar as atividades missionárias de Paulo e seus companheiros: “Pois vocês ainda se lembram, irmãos, de nosso trabalho e fadiga. Noite e dia trabalhando para não sermos de peso para nenhum de vocês, nós assim lhes proclamamos o evangelho de Deus” (2,9).
Paulo, um artesão, teve de trabalhar à noite para se manter. Trabalhava numa oficina de fabricantes de tendas, em um centro urbano muito movimentado, com uma rota comercial importante e um excelente porto, onde funcionavam as associações voluntárias dos artesãos, como as de fabricantes de tendas. Por isso, é compreensível que os pesquisadores afirmem que Paulo aproveitou e utilizou o ambiente e o espaço da associação para constituir a comunidade:
A oficina que ficou sendo o endereço de Paulo era a base estável de unia rede de contatos já organizada por seu empregador, por seus fregueses e companheiros de trabalho. Todos esses três grupos tinham suas famílias e amigos; entre eles haveria um contínuo intercâmbio, muito variado em diferentes níveis, e disso tudo Paulo tirou proveito (Jerome Murphy-O’Connor, p. 93).
Na Primeira Carta aos Tessalonicenses, Paulo exalta e relembra a seus convertidos a dignidade do trabalho manual: “Que seja para vocês uma questão de honra levar vida tranquila, ocupando-se com as próprias coisas e trabalhando com as próprias mãos, conforme os instruímos. Desse modo, vocês levarão vida honrada aos olhos de fora, e vocês não precisarão de ninguém” (4,11-12).
No mundo greco-romano, o “trabalho manual”, em geral, era executado por escravos, o que permitiria afirmar que a maioria dos convertidos cristãos de Tessalônica era escravo. Geralmente, nas grandes cidades do Império Romano, a vida dos escravos era muito dura e breve. Eles tinham de trabalhar doze horas por dia, sete dias da semana. A perspectiva de vida não passaria além dos vinte anos. De modo especial, os trabalhadores imigrantes nos centros urbanos sofriam mais ainda com o deslocamento e isolamento. Nessa vida de insegurança, as associações voluntárias davam aos membros a satisfação e a sensação de proteção: reuniões, festas, refeições comunitárias e, acima de tudo, a divindade protetora.
É bom relembrar que, em vista da sobrevivência, Paulo e seus companheiros entraram nesse mundo dos trabalhadores. Aproveitaram e transformaram, pouco a pouco, uma das associações em uma comunidade cristã. Ou eles mesmos fundaram a comunidade em sua realidade. A oficina de trabalho de Paulo, fabricante de tendas, tornou-se o endereço da missão: “trabalhando e anunciando o evangelho de Deus”.
É claro que há semelhanças entre a associação voluntária e a comunidade cristã: os participantes, como membros, eram voluntários; organizavam rituais de iniciações, reuniões, festas, celebrações, as refeições comunitárias (ceias) etc. Mas também existe uma grande diferença: Paulo anuncia o evangelho de Jesus de Nazaré crucificado e ressuscitado como a divindade patrona da comunidade: “Felizes vocês, os pobres, porque de vocês é o Reino de Deus. Felizes vocês, que agora têm fome, porque serão saciados. Felizes vocês, que agora choram, porque hão de sorrir” (Lc 6,20-21). Um evangelho de libertação para os pobres!
O movimento de Jesus transforma os pobres trabalhadores em sujeitos da história no mundo escravista! No mundo violento e opressor, no qual vivem os trabalhadores nas cidades do Império Romano, a comunidade cristã, moldada pelo evangelho de Jesus, é a força e o espaço no qual eles conseguem recuperar a dignidade, a esperança e a vida. Na comunidade, cada pessoa é amada e respeitada na irmandade: “Que o amor seja sem fingimento. Detestem o mal e apeguem-se ao bem. Amem-se uns aos outros com carinho de irmãos, cada um considerando os outros como mais dignos de estima” (Rm 12,9-10). Paulo prega e se esforça a favor da criação de um espaço, ou seja, uma associação para que todos, sobretudo os pobres, sejam acolhidos com dignidade, igualdade e fraternidade.
Evidentemente, nem sempre as mensagens de Paulo foram assumidas e vividas totalmente pelas comunidades. Nelas, havia comodismo, desunião, discórdias e conflitos: a discriminação por causa da etnia e classe, por exemplo. Mas, não se deve esquecer que houve o grande esforço de Paulo para manter o acompanhamento e orientação para as comunidades através de visitas e cartas.
É dentro dessa preocupação pastoral que Paulo enviou Timóteo para verificar a situação da comunidade de Tessalônica, uma comunidade recém-fundada e perseguida. No retorno, ele trouxe boas notícias: a comunidade mantinha a firmeza da fé. Mas trouxe também a preocupação, dúvida e problema da comunidade, sobretudo sobre a parusia do Senhor. A expectativa da parusia, por exemplo, incitava alguns a omitir-se dos fundamentos da comunidade. Em 1Ts 5,12-22, Paulo redige algumas exigências da vida comunitária, para que a comunidade seja uma associação fraterna e um espaço de vida e liberdade para os pobres trabalhadores.
Nesse ambiente, Paulo fundou comunidades que fossem espaços de vida digna, especialmente para as pessoas pobres. Na comunidade, algumas pessoas cruzaram os braços, acreditando que a vinda gloriosa de Cristo seria imediata, por isso Paulo fez diversas exortações para que a comunidade vivesse uma espera ativa, sendo espaço de fraternidade, solidariedade e comunhão. Um apelo para que as pessoas cristãs vivessem neste mundo como cidadãs do Reino de Deus.
Quais as recomendações dadas por Paulo à comunidade de Tessalônica? Quais os desafios enfrentados pelas lideranças de Tessalônica? Quais são as atitudes que atrapalham a vida da comunidade?
Iluminando a vida: Eis as orientações práticas para o dia a dia da comunidade:
O que caracteriza a comunidade que segue Jesus Cristo é o compromisso com os pobres. Ao fazer a sua exortação, Paulo cita três grupos: os que não fazem nada, os desencorajados e os fracos:
2. Ajudem os fracos: em 1Cor 8,7-14, Paulo usa esse termo para designar os cristãos de fé insuficiente e que ainda se escandalizam com os que comem comida sacrificada aos ídolos. E necessário que a comunidade exorte, encoraje e ajude os fracos, para que possam praticar em sua vida concreta as exigências de sua fé em Jesus Cristo crucificado e ressuscitado.
Finalizando as exortações, Paulo pede que os fiéis de Tessalônica sejam pacientes com todos. É preciso cuidar para não “retribuir o mal com o mal” (5,15). Ensinamento ético que já estava presente na ética judaica e se intensificou no movimento de Jesus: "Nunca diga: ‘Vou retribuir o mal que me fizeram'. Espere em Javé e ele o salvará”(Pr 20,22); "Não retribuam a ninguém o mal com o mal. Procurem o que é nobre diante de todos” (Rm 12,17; cf. Mt 5,38-39; 7,12; Lc 6,27-28; 1 Pd 3,9). Não vivam na teologia da retribuição, mas, sim, vivam na teologia da gratuidade, experimentada e manifestada na vida de Jesus de Nazaré.
Alguns membros da comunidade podiam estar agindo de maneira contrária aos princípios da fé assumida. Parece que a comunidade estava no limite. Nesse clima, as palavras de Paulo deviam acalmar os ânimos dos mais exaltados. Em um grupo, é muito difícil manter-se em paz! E, mais ainda, ser paciente com todos. As exortações de Paulo são difíceis e, muitas vezes, nós não somos pacientes, mas sim indiferentes, o que é contrário ao projeto de Deus.
No capítulo 5,16-22, há uma série de frases, no modo imperativo, começando com a exortação à alegria:
Essas exortações foram dirigidas à comunidade de Tessalônica e devem ser vividas por todas as comunidades que seguem Jesus. Trata-se de uma ética pautada no respeito e no direito de cada pessoa. O Papa Francisco insiste na importância de uma renovação pastoral para assumir o ser uma igreja em saída: pobre com os pobres. Revisitando a comunidade de Tessalônica, queremos reacender o nosso espírito de discípulos e discípulas em nós e em nossas comunidades. Quais as exortações que Paulo faria para a nossa comunidade? Quem são as pessoas que precisam de cuidados especiais em nossas comunidades? Quais as características que as nossas comunidades devem assumir para serem missionárias? O que devemos fazer para despertar novas lideranças?
Nosso desejo é que nossas casas e comunidades sejam espaços de vida digna e solidária para todas as pessoas.
Benção: O Deus da paz vos santifique completamente. Vos conserve íntegras em espírito, alma e corpo, e irrepreensíveis para quando vier o Senhor Jesus Cristo. A graça do Senhor Jesus Cristo esteja convosco (1Ts 5,23ss). Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. Amém